Nós também “Ainda Estamos Aqui” Maurício Rosa- Crônica.
O filme brasileiro “Ainda Estou Aqui”, foi indicado em três importantes categorias do Oscar. E muita gente pensa:
“qual a diferença que isso faz na minha vida?”. Eu respondo: “toda”. Principalmente para quem tem filho jovem.
Há anos produzimos filmes incríveis que ninguém assiste.
Há anos escrevemos livros maravilhosos que quase ninguém lê.
Há anos o teatro é carregado, literalmente, nas costas pelos atores e equipe.
Há anos muita gente talentosa perde oportunidade porque não existem lugares, muito menos olhos e dinheiro para que o sonho se realize.
Há anos a cultura míngua, rasteja, se humilha por um segundo de atenção.
Há tempos existem pessoas que criticam o investimento na cultura – o mísero e, muitas vezes, mal usado pataco – exigindo que isso seja melhor “distribuído”, o irônico é que essa proposta sempre parte dos que já têm. Que leem um livro por ano: o da sua própria contabilidade.
“Ainda Estou Aqui” conta a história de uma família de classe média alta vivendo em um período que jamais devemos pensar em retornar.
Um regime assassino, que não escolheu raça, idade e religião. Uma ditadura que criava constituições e atos como se tivesse brincando de criar. Mas estamos falando de histórias com leis que afetaram vidas reais, que como um sopro veemente de raiva, jogava ao ar pessoas que até hoje têm apenas seus nomes em um memorial. Resgate esse que fez parte da luta da personagem principal do longa.
A cultura provoca e deve fazer isso e eu sempre digo: a arte é a fotografia de uma época. Seja feita por filmes ou livros.
Nossa sociedade sempre foi polarizada. A Internet apenas removeu as “cobertas”. A elite – sem imaginação, mas podero$a – sempre dificultou na construção dos degraus culturais. Então, quando a gente consegue, finalmente, subir mais um passo, precisamos, sim, comemorar.
E é por ser tão lenta, a formação dessa escada, que esses reconhecimentos internacionais nos dão suporte motivacional e mostram que vale muito acreditar nos sonhos.
Dinheiro sempre gerará discussão. Fato! O que não podemos deixar acontecer é que ele vire O PROBLEMA. Aquela pedra enorme. Se não podemos remover, vamos contornar. Um exemplar de um livro, trabalhado em sala de aula, pode gerar vários futuros leitores. E muitas vezes aquele foi o único livro que o autor publicou.
A cultura brasileira estava em coma, mas acordou. Agora é manter os cuidados para retirá-la do hospital e retomar com força os trabalhos. E quando digo trabalho, é incluir a cultura cada vez mais na educação dos nossos jovens, esse é o ponto de partida.
A arte não imita ela retrata a vida. De nada serve para eu escrever se não for sobre o que eu vivo e observo. Não me interesso a pensamentos negativos, falácias invejosas e meneios faciais de incômodo. O brasileiro tem essa mania de se incomodar com o êxito do outro. Eu, assim como muitoa outros, preferimos exaltar.
Quem trabalha com arte tem uma responsabilidade muito grande. Um país ou uma cidade sem cultura está fadada a ignorância. Por isso, se você ainda não assistiu ao filme, que o observe com o título de eleitor em mãos, porque até quem critica o longa dirigido por Walter Salles, pensará melhor no valor desse documento. Se com ele já é complicado, imagina sem.
Arte é movimento, da parte artística, rápido. Dos órgão e apoiadores, lento. É um corta dinheiro, vai lá, ali, no cume, no buraco, corta transporte, alimentação, dorme no chão, no carro, no circo, no teatro, corta água, luz, corta tudo.
Coloca palhaços na cacofonia do trânsito lutando contra o calor que vem do sol e o que vem do asfalto. Onde o artista transforma o sinal de trânsito em um circo com plateia que aplaude com buzina – ou pede pra sair – cães, vendedores, motociclitas e ambulantes apressados.
Um espetáculo com péssima bilheteria. Aliás, um espetáculo que nem deveria existir. Rua não é lugar de artista, muito mesmo para pessoas morarem.
E seguimos, cortando o pano para fazer o boneco e o fundo do palco, gastos com algo não prioritário para investir no livro e “etecetera”. No final sai o livro e a peça. A gente sempre vence, mesmo com a condição frágil e muitas vezes vista, infelizmente, com incredulidade e deboche.
Peço aos governantes, inclusive locais e empáticos, que nos apreciem com ainda mais respeito. Se o talento de nossos jovens não for descoberto e trabalhado, eles vão investir toda essa energia em outra coisa.
Sem falar dos que vão embora para cantar, dançar e escrever em outras bandas. Muitos conquistando apenas um prefixo ao verbo. O sonho de VIver torna-se o de SOBREviver.
Arteiros e arteiras, jovens e adultos, continuemos. O esforço vale.
Podem se passar vinte e seis anos para que mais um degrau fique pronto. A gente espera. Até porque é na espera que a gente faz acontecer.
Que as batatas que Quincas Borba falava se multipliquem para que tenhamos cada vez mais vencedores.
Obrigado pela leitura!