Sepé, San Sepe, São Sepé – terra do ouro, terra de tantas histórias

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A História não é uma “ciência exata”, evidentemente. Por outro lado, sendo o resultado das ações humanas que são levadas a efeito ao longo dos séculos, permite que o historiador trabalhe com registros documentais, com relatos, com “resquícios” de um passado que nem sempre se pode comprovar, assim sendo a História exige extremo cuidado na sua escrita.

Não nos iludamos, porém, que a História seja neutra, ela trará a voz dos vencedores, dos poderosos, daqueles que dominam uma narrativa num determinado tempo histórico. Desse modo, com base em novos achados, ela pode ser revista, desde que essa revisão traga comprovação.

Não sou historiadora de profissão, na verdade, sou formada em Letras e um dos primeiros artefatos de trabalho como professora de Literatura foi a “Carta” escrita por Pero Vaz de Caminha, em 01 de maio de 1500, tratando do achamento do Brasil por parte dos portugueses. Costumava brincar com os meus alunos do ensino médio, que os portugueses deixaram a Europa em 09 de março, portanto, inverno, viajaram 44 dias, sob sol, chuva, vento, maresia e chegaram à Bahia em 22 de abril. Se o vento estivesse favorável, não foram os portugueses que chegaram ao Brasil, mas os indígenas que pressentiram algo fétido no ar. Uma lástima para todos nós que não tenhamos o registro dos nossos indígenas sobre aqueles homens que aqui aportaram. No México, pelas roupas e pelas barbas, os nativos acharam que eram deuses (como se sabe, se eram deuses, eles eram deuses muito maus).

Conforme as minhas pesquisas, a origem do nome do município de São Sepé estaria associada ao corregedor da estância de São Xavier, sob jurisdição de São Miguel, nos Sete Povos das Missões. Trata-se do índio guerreiro Sepé Tiaraju, que tombou, na luta por sua terra e sua gente, na batalha de Caiboaté, território de São Gabriel, em 1756. Em vida, porém, recorreu boa parte do Rio Grande em combate por seus ideais, como Santa Tecla, Rio Pardo, Passo do Jacuí. Sepé Tiaraju teria se tornado, após a sua morte, um símbolo de devoção popular, daí a denominação São Sepé. De qualquer forma, entende-se que se trata de uma história que tem vertente popular, sem registros históricos que a confirmem.

Do ponto de vista histórico, há registros que São Sepé teria sua origem numa estância missioneira já existente nessa região, chamada San Sepe. Por outro lado, antes mesmo da existência da região do atual município de São Sepé, já existiria, nas barrancas do Uruguai, um topônimo chamado San Sepe.

Outra abordagem histórica é pautada no fato que Sepé Tiaraju esteve em nossa região e nada impediria que, em razão da sua bravura, sua astúcia, tenha encontrado indivíduos dispostos a prestar-lhe homenagem. De maneira confirmada, Sepé Tiaraju esteve no encontro dos índios guaranis com tropas portuguesas comandadas por Gomes Freire no Passo do Jacuí, em 1754, no atual território de Restinga Seca, e foi morto em Caiboaté, São Gabriel.

Numa narrativa em se mesclam lenda e verdade, acredita-se que o corpo do índio Sepé teria sido enterrado às margens de um rio, que receberia, tempos depois, o nome de Arroio São Sepé, ou ainda em uma gruta no atual município, fazendo-se crer que seria a Gruta do Marco, permitindo à crença popular acrescentar que a Pulquéria teria sido uma índia apaixonada por um guerreiro indígena envolvido em lutas, que nunca mais voltou. As suas lágrimas representariam a dor da saudade – vertidas nas corredeiras e quedas d’água que lhe prestam homenagem.

Para conceder um pouco mais de credibilidade aos meus estudos, trago os escritos de Felipe Rios Pereira, para quem, em mapa do século 18, existe o registro do Rio São Rafael, mas que: “Em algum momento, nesta década de 1770, o rio passaria a se chamar Rio São Sepé.”

Se vocês me permitirem, outro dia, eu conto um pouco sobre Restinga Seca, minha terra natal e minhas pesquisas a respeito de sua origem.

Elaine dos Santos

Prof. Dra. em Letras