Cartas marcadas: Mauricio Rosa
Ana, ao verificar o edital na internet, começou logo a reunir sua valiosa documentação. Diploma, certificados, atestados e um currículo completo, elaborado aos mínimos detalhes.
Além disso, Ana escreveu sobre todas as possíveis questões que seriam feitas. Treinou com familiares e amigos. Embasou-se sobre o assunto e a área na qual estava a se candidatar. Imaginou algo mais completo e articulatório.
Chegou quinze minutos antes. Ao ser chamada, encontrou-se com duas pessoas, uma lhe cumprimentou com muito respeito e simpatia e a outra nem olhou para seu rosto, ficou verificando o aparelho celular.
As perguntas iniciam:
– Qual o interesse na vaga?
– Quais seus pontos fracos e fortes?
– Trabalha bem em grupo?
– Tem disponibilidade de horário?
– Tem experiência?
– Qual seu grau de estudo mesmo?
Então, Ana, pergunta: você não leu meu arquivo? Algumas dessas questões já estão respondidas.
A “entrevistadora” responde: olhei meio por cima.
A outra pessoa fica mexendo no telefone dando leves sorrisos para algum “meme” que recebeu e só levanta para encher a cuida de chimarrão. A única pergunta que faz é: leu bem o edital?
Então, sem apresentar menos da metade dos argumentos que tinha, Ana é dispensada.
Dias depois o resultado: decepcionante. Ana sentiu-se uma palhaça.
Através de conversas e pesquisas, ela descobriu que sua pasta de arquivo e aquela entrevista era só um motivo burocrático. Ela descobriu que deveria ter dado abraços nas pessoas certas, apertar mãos corretas, oferecer café, distribuir panfletos e até fazer uma janta, com sobremesa a gosto. Também descobriu que precisa melhorar as amizades. Falar menos de sua vida pessoal e focar em seu desenvolvimento.
O “processo seletivo”, ela definiu como uma mesa de jogatina. Não importa quais são as suas cartas e quantas vezes você praticou. Antes do jogo começar, já há um vencedor.
Guimarães Rosa dizia: “Pão ou pães, é questão de “opiniães””. O Sertão está em todo lugar.
Maurício Rosa diz: “Palhação ou palhações, todos “somões””. O Circo está em todo lugar.
Tenham empatia com os candidatos. Ouçam com seriedade, estudem seus currículos, não só cobrem a experiência, mas ofereçam-na. Ninguém nasce sabendo. Tenham posturas profissionais, o futuro da pessoa depende da sua decisão e você se preocupa com a água do mate. Respeitem a condição alheia. Um dia pode ser você que estará do outro lado da mesa.
A entrevista é um complemento ao currículo e às empresas e instituições, inclusive governamentais, usam como pano de fundo para “julgar” quem, na verdade, já foi escolhido, fazendo os outros perderem tempo.
Não generalizo, pois generalizar também é ser intolerante
Meu trabalho como autor também é criticar, doa a quem doer. O artista tem isso dentro de si, falar pelos que não podem ou não têm coragem. Não pode ficar escondido guardando uma opinião que, devido a sua função e reconhecimento, tem muita relevância.
Ana gastou tempo, energia, dinheiro com impressões de documentos, mas, como a batalhadora que é, ainda mantém a esperança.
Serviu o chapéu? Encaixa bem ele na cabeça e monta no cavalo da tua falta de empatia.
#esseéobrasilquedacerto