Cilon ainda está aqui! Felipe Rios Pereira

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O sucesso do filme “Ainda estou aqui” encantou multidões pelo país. A história de Eunice e sua luta para fazer justiça pela memória do marido, Rubens Paiva, assassinado pela Ditadura, foi capaz de mostrar o quanto famílias foram despedaçadas e sofreram com as perseguições daquele tempo. Acontece que este esteve longe de ser um caso isolado. O horror de ter familiares mortos sem escrúpulos por militares está muito mais próximo do que possa parecer. Há alguns anos, conheci o senhor Lino Brum Filho. Os relatos que ele me passou, levaram-me às lágrimas. Seu irmão, era Cilon Cunha Brum, um jovem nascido em São Sepé, que, ainda com 17 anos, foi buscar o futuro na cidade grande. Além de parentes, eram amigos próximos, a ponto de a futura filha de Lino tornar-se afilhada. Ocorre que Cilon terminaria, assim como Paiva, uma de todas aquelas vítimas, justamente por ousar lutar pela liberdade e não aceitar aquele momento político. Quando vi a tristeza de Eunice e das informações desencontradas que recebeu intencionalmente dos militares, lembrei-me, do que me narrou Lino. De quando mentiras de que seu irmão estaria vivo foram jogadas para confundir a família. Da falta de humanidade a ponto de fazer Eloá, mãe de Cilon, crer até o fim de sua vida que o filho retornaria. De até hoje não haver a decência dos algozes de fazer a devolução do corpo à família enlutada. Hoje, no cemitério de São Sepé, há uma lápide ainda a espera do descanso de Cilon. Da mesma forma, o corpo de Rubens nunca foi entregue à esposa e filhos. Desde que conheci Lino pude perceber nele uma fortaleza, a figura de um homem inteligente, o qual nunca abandonou a memória do irmão que tanto amou. Ao longo dos anos envolveu-se na luta política pela resolução do caso, em processos judiciais e até realizou buscas de informações de forma pessoal no Araguaia. Uma das cenas mais marcantes protagonizada pela atriz Fernanda Torres é quando a protagonista finalmente, depois de décadas, recebeu do Estado Brasileiro, em 1996, o reconhecimento do assassinato de Rubens Paiva. Um dia, faz uns anos, Lino me chamou por mensagem. Ele estava orgulhoso pois estava agora portando aquele mesmo documento. A morte de Cilon havia sido retificada no atestado óbito. O estado admitia a partir de agora que em fevereiro de 1974, aquele jovem, que crescera no bairro Tatsch, que estudou no Tiaraju, que cursou economia, que foi amado pela família….foi executado pelos militares. A luta de Lino havia conquistado essa admissão. Pessoas como ele, fazem a História permanecer. Que a injustiça seja teimosamente não aceita. Sonho um dia que ainda a família terá o corpo de volta. Sonho o dia que a Anistia de militares assassinos será revista. Sonho um dia que o Brasil se encontre com sua História. Até lá, tantos como Eunice e Lino seguirão lutando.

Cilon, presente! Ele ainda está aqui!

Lino Brum Filho, com a certidão de Cilon retificada comprovando o assassinato do irmão na Ditadura.

Eunice, interpretada por Fernanda Torres, recebendo a certidão de óbito do marido.