É no fio do bigode – Sérgio da Silva Almeida – Crônica

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Após dar uma palestra na Festa & Cia, em Alegrete, na noite chuvosa de terça-feira, fui presenteado com uma daquelas histórias que parecem pequenas, mas carregam lições imensas. O amigo Sandro Sanchotene, distribuidor autorizado da Eko’7 para a região Sudeste do estado, compartilhou comigo um episódio curioso, ocorrido ali mesmo — naquela terra onde a expressão “é no fio do bigode” ainda tem valor. Essa expressão, típica do vocabulário gaúcho, significa compromisso firmado pela palavra, sem necessidade de contrato escrito.

Uma amiga dele havia adquirido um número de rifa cujo prêmio era um carro popular. No calor da empolgação, e talvez sem medir o alcance do que dizia, virou-se para uma conhecida e declarou: — Se eu for sorteada, o carro é teu!

A frase escapou dos lábios com leveza, como um gesto afetuoso e despretensioso, típico de quem não imagina que a sorte baterá à sua porta. Mas, para surpresa geral, o improvável aconteceu: o número que ela havia comprado foi sorteado.

Foi então que a euforia do prêmio deu lugar a um dilema moral: cumprir ou não a promessa feita num momento de euforia? Ao final, encontraram um meio-termo. A promessa não foi cumprida por completo, mas tampouco foi ignorada. Ainda assim, a história permaneceu — como um convite à reflexão.

Enquanto ouvia Sandro narrar o caso, recordei um episódio bíblico carregado de peso e simbolismo: o do rei Herodes, que, fascinado pela dança da filha de Herodias durante as festividades de seu aniversário, jurou conceder-lhe qualquer desejo.

Instigada pela mãe, a jovem fez um pedido que ecoaria pela história: — Quero a cabeça de João Batista numa bandeja.

Mesmo contrariado, Herodes manteve sua palavra — pois havia prometido diante de muitos. E João Batista, o homem que batizou Jesus, perdeu sua cabeça.

Ambas as histórias, embora distintas em gravidade, convergem em um ponto essencial: prometer não é apenas falar — é selar e, sobretudo, cumprir um compromisso.

A grandeza está justamente em manter o que se disse. E, se há algo que essas histórias nos ensinam, é que palavra dita não deve ser só da boca para fora — é no fio do bigode.