Ruas da cidade à noite: Sérgio da Silva Almeida

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“Ah, não, essa imagem não. Uma garotinha desse tamanho dentro da pancadaria no Beira-Rio. Lamentáveis as imagens. Sobrando sopapos, socos e pontapés.

Estou atônito e sem palavras para definir tanta irracionalidade”, dizia o narrador esportivo Gustavo Villani ao ver o torcedor invadir o gramado do Beira-Rio com sua filha no colo durante briga generalizada, após a eliminação colorada para o Caxias na semifinal do Gauchão.

A cena foi de tirar o fôlego, e me deixou vidrado em frente à TV. Enquanto o pai desferia chutes e socos a esmo, a menininha, de apenas 3 anos, chorava desesperada, ao mesmo tempo em que era jogada de um lado para o outro em seu colo. E aí vem a pergunta: estádio é ambiente para crianças?

Como era bom aquele tempo em que juntava a gurizada na rua e todos iam para a calçada jogar conversa fora. Ficávamos até tarde da noite sem nos preocupar com violência. Batíamos bola nos campinhos de terra e nas quadras esportivas. Meu pai me levava aos Gre-Nais no Olímpico, e antes dos clássicos costumávamos almoçar na Churrascaria Mosqueteiro, que funcionava no térreo do prédio contíguo ao estádio.

 

Quando me tornei pai, a exemplo de meu pai, levei meus filhos ao Olímpico, ao Jaconi e à Arena Condá. Porém, desventuradamente, há anos não os tenho levado mais, pois, diferentemente do meu tempo de guri, em que o risco era ser atingido na cabeça por uma cusparada ou um saco de xixi que vinha da arquibancada superior, de uns tempos para cá, frequentar estádios virou sinônimo de tensão.

Em jogos que envolvem times de muita rivalidade, movidos pelo fanatismo, torcedores (será que dá para chamá-los assim?) depredam banheiros, quebram cadeiras, explodem bombas em ônibus de clube e até ameaçam de morte treinadores e jogadores que são trabalhadores, sujeitos a cometer erros.

 

Sobretudo, há outro lugar que não sinto segurança em deixar meus filhos frequentarem: as ruas da cidade à noite. Não raro leio nos jornais sobre confusões e brigas que estão virando rotina em muitas cidades.

Por isso, embora alguém possa torcer o nariz, do jeito que as coisas estão, deixar um filho sair à noite é expô-lo ao mesmo risco da garotinha no colo do pai em meio à confusão entre os jogadores.